Realizei nesta semana um sonho da minha adolescência: dei-me de presente de natal as gravações completas do Robert Johnson, caixa sobre a qual li pela primeira vez em 1990 e pus as mãos, babando, em 1993. Um moleque de cabelo comprido e jaqueta surrada agradece, em algum canto da memória.
O bluesman gravou apenas 29 composições, e a maior parte delas tem dois ou três takes. Nisso, o mimo que me dei não é tão completo assim: falta uma versão de "Traveling Riverside Blues" (que eu tenho em outro disco). Você possivelmente sabe desse número limitado de músicas se assistiu ao filme "A Encruzilhada", em que o Karatê Kid enfrenta Steve Vai num torneio de guitarras ao procurar uma composição perdida - inexistente - do bluesman. Filminho bobo, mas abre curiosidades.
Robert Johnson tinha um estilo de vida comparável ao de tantos roqueiros que influenciou depois de sua morte: mulheres carentes, bourbon e blues. Tal como Jimi Hendrix, ele não era exatamente um virtuose da voz, mas fazia misérias com as cordas enquanto cantava e dava seus gritos ("EEE-HEEE!"). Tal como Hendrix e outros tantos, morreu aos 27 anos, depois de se meter com mulheres erradas e, segundo o último bluesman com quem tocou, beber cerveja de uma garrafa aberta fora de seu campo de visão. Johnson possivelmente morreu envenenado.
Keith Richards, o guitarrista dos Rolling Stones, julga a obra de Johnson o ápice do rock. Eric Clapton, até os 25 anos, não dava pelota a ninguém que não conhecesse sua obra - e, quatro décadas mais tarde, gravou um CDs e um material de ensaios em homenagem ao seu mestre. Se você assistir ao filme "Stoned", que conta o fim da vida de Brian Jones (o outro guitarrista dos Stones), verá por repetidas vezes o sujeito ouvindo músicas de Johnson - possivelmente da coletânea "King of the Delta Blues Singers", lançada em 1961. Robert Plant, no Led Zeppelin, chupava literalmente trechos de Johnson:
- Now you can squeeze my lemon 'til the juice run down my...
(falado) 'til the juice rune down my leg, baby, you know what I'm talkin' about
You can squeeze my lemon 'til the juice run down my leg
(falado) That's what I'm talkin' 'bout, now
Eu adoraria pôr um vídeo do YouTube neste post que mostrasse Johnson tocando. Mas ele teve sua carreira muito antes de vídeos de artistas serem algo comum. Mais ainda: só se conhece duas fotos indubitavelmente dele e uma terceira duvidosa.
Uma coisa que muito me agrada, porém, é ouvir guitarristas falando de como tocam. Ou das dificuldades que têm para tocar. Tive algumas aulas de violão clássico, meia vida atrás, mas parei de praticar para estudar para o vestibular. Hoje toco violão muito mal, mas conheço do instrumento o suficiente para aumentar meu fascínio por violões e guitarras sempre que vejo alguém tocando bem ou falando sobre como toca.
Abaixo, está um vídeo em que Clapton explica as dificuldades que teve para regravar as músicas de Johnson. É particularmente interessante porque o CD "Me and Mr. Johnson" inicialmente me pareceu meio que um trabalho de João-Sem-Braço. Johnson tocava sozinho, e como eu disse antes ele fazia malabarismos com as cordas enquanto cantava. Clapton, por sua vez, quase sempre usou uma banda pra completar o som. Ficou mais moderno? Ficou. Mas a guitarra ficou mais simplificada. O vídeo abaixo é o segundo grande momento de humildade em que pego Clapton. O primeiro está no disco "The Howlin' Wolf London Sessions", em que o velho lobo o ensina a tocar "Little Red Rooster".
Vejam só a dificuldade que um dos guitarristas mais aclamados do mundo enfrentou para reproduzir o que Johnson fazia há 70 anos:
Nenhum comentário:
Postar um comentário