Meu amigo Bul, um dos mais ardorosos defensores do governo que conheço em listas de discussão sobre quadrinhos, mandou outro dia um e-mail indignado. Ele recebeu um artigo escrito pelo senador tucano Arthur Virgílio, em 2002, criticando a não-prorrogação da CPMF. Anteriormente, circularam na internet declarações antigas do presidente Lula, defendendo o fim do tributo. Exatamente o contrário do maior Gre-Nal do final de 2007.
Respondi que a opinião do senador-propaganda do Guaraná Antarctica, como de resto a opinião manifestada pela maior parte dos políticos, simplesmente não me interessa. O Bul ficou indignado: "Essa é sua posição profissional?", perguntou. Respondi que sim. Ele ficou espantado em ver um jornalista que cobre política e não se interessa pela opinião dos políticos. Mas é exatamente por acompanhar muito a política que eu mantenho essa posição.
Levar a sério o que diz a maior parte dos políticos - especialmente os mais proeminentes - no meio de debates acirrados é como aceitar uma nota de treze reais, roxa com bolinhas amarelas e com a cara do Costinha impressa no lugar da onça. A opinião expressa deles muda conforme a gangorra vira, porque eles pensam muito bem o que dizem para não dizer o que pensam.
(Era aqui que eu iria inserir aquele trecho do Bakunin, mas desta vez não. Procurem nos arquivos do blog.)
Aliás, é esse o grande problema do jornalismo de política brasileiro, atualmente. Ele concentra-se demais no bate-boca entre os políticos. Perdi a conta de quantas vezes eu folheei o jornal pela manhã e suspirei um "ai, meu saco..." ao ver páginas e páginas recheadas de opiniões, palpites, chutes e previsões sobre o Grande Assunto do dia. O que me interessa são as questões de fato, que podem ser checadas. Mas, a partir dessas, a coisa vira um tiroteio de opiniões, palpites, chutes e previsões, se o assunto esquentar.
Veja o caso da famosa entrevista do Zé Dirceu, por exemplo. Ele fez algumas afirmações naquela entrevista que dizem respeito a fatos concretos. Por exemplo, falou nas malas de dinheiro com que a sede do PT em Porto Alegre teria sido paga. Houve uma CPI sobre o assunto na Assembléia Legislativa do RS em 2001. Alguém procurou mergulhar nos arquivos da AL-RS para ver o que existe de fato que possa confirmar ou derrubar o que ele diz? Se procurou, eu não li. Tudo o que aparece é palpitaria.
O PSDB, por exemplo, propôs criar uma CPI para investigar as declarações de José Dirceu relativas ao caso do Mensalão. Já houve CPIs. Há muita informação boa nos depoimentos delas - o Lucas Figueiredo tirou um livro inteiro praticamente só disso, lendo cuidadosamente os dados e montando o quebra-cabeças. Mas ir aos documentos, além de dar um trabalhão, não alimenta a roda do declaratório - o grande esporte da política nacional.
Resulta disso que a forma como se cobre política no Brasil é mais ou menos semelhante à forma como se cobre futebol. Ou pelo menos tão auto-referente quanto. Com a diferença de que os personagens são bem menos atléticos, usam uniformes menos chamativos e, tirando o Renan Calheiros, não namoram capas da Playboy. Mas o maior problema disso é quando essa cobertura dá margem a um clima de brigas de torcida, como vem acontecendo no Brasil especialmente desde 2006.
Pior: as brigas de torcida do futebol, pelo menos, giram em torno de fatos.
sexta-feira, 11 de janeiro de 2008
A gangorra do ar quente
Postado por Marcelo às 13:14
Marcadores: cultura política, jornalismo
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