quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Brasil vigilante - mas só dos fracos

A ONG européia Privacy International acaba de lançar seu atlas do respeito à privacidade no mundo.

A questão é um dos lados da grande moeda da sociedade da informação: como balancear um nível cada vez maior de informação, o que permite fiscalizar melhor o poder e o crime, com a proteção da intimidade dos cidadãos, que está exposta geralmente aos mesmos mecanismos. Pense por exemplo no caso da perda de um CD governamental com dados bancários de uma grande parte da população inglesa, por exemplo.

O Brasil ficou na classificação vermelha, que significa "falha sistêmica em garantir as salvaguardas" à privacidade. O país está entre os piores do mundo em dois quesitos: garantia da privacidade e vigilância de dados médicos, financeiros e movimentos. O resumo do diagnóstico é este:

    * Proteções constitucionais asseguradas pela Constituição de 1988; recentes decisões judiciais resultam em uma proteção fragmentada, e por isso os registros bancários são protegidos, mas os bancos de dados não são, necessariamente; e-mails arquivados também;
    * Não há lei de privacidade dos dados, mas existe uma em consideração;
    * Não se pode forçar a correção de dados;
    * O Código Civil protege a privacidade, mas abre exceções para o cumprimento da lei; não há comissão regulatória;
    * Protege o direito da privacidade de crianças, em lei de 1990;
    * O teste de intercepção é relativamente simplista;
    * A lei requer uma identificação para uso nos setores público e privado, mas nunca foi implementada; no setor privado, aumenta o uso da biometria;
    * Recentes controvérsias sobre a censura ao YouTube;
    * Registros bancários são protegidos pela Constituição, e só podem ser entregues sob ordem judicial;
    * Crescentes preocupações sobre a vigilância no local de trabalho levaram a uma decisão da justiça trabalhista dizendo que o monitoramento é ilegal, a menos que haja ordem judicial, mas as proteções não se aplicam a contas de e-mail corporativas; o monitoramento em vídeo é ilegal, segundo decisão recente;
    * Interceptação de comunicações é considerada um crime sério, mas continua a haver grampos ilegais e há preocupações de que a indústria do conteúdo esteja espionando redes brasileiras sem mandado [NM: Operação Gutenberg?];
    * O acesso a informações sobre tráfego de dados não é protegido pelas regulamentações da privacidade, segundo o Superior Tribunal de Justiça; o projeto de lei que propunha identificar quem acessava a internet falhou, mas a lei ainda exige que os provedores de acesso identifiquem à polícia condutas ilegais;
    * Extensa vigilância de viajantes nas estradas, com identificação de freqüência de rádio mas pouca proteção à privacidade.

O relatório completo sobre o Brasil também inclui as contradições brasileiras no tocante ao direito de acesso a informações públicas. Segundo a Privacy International, as leis brasileiras sobre o direito à privacidade não estão relacionadas a outras leis e tratados que dizem respeito ao assunto.

O sigilo das informações públicas é defendido com unhas e dentes, com níveis de classificação e comissões de verificação que quase nunca se reuniram para liberar documentos. Mas a privacidade do cidadão é mantida em níveis precários.

Nenhum comentário: