Philip Meyer, o homem cujas idéias mudaram minha visão do que é jornalismo, está prestes a se aposentar. Está com 80 anos, e dará aulas na Universidade da Carolina do Norte até a última vez em que for bater ponto. O jornal Raleigh Chronicle, cujo editor-chefe é um discípulo de Meyer, publicou uma boa entrevista com o velho mestre, focando especialmente no papel dos jornais para o futuro.
A aposentadoria dele me deixa um pouco sem chão. É claro que ele merece esse prêmio de poder ficar em casa curtindo os netos -- coisa que será muito mais difícil para alguém da minha geração. Por outro, é uma pena ver um cérebro importante como o dele se retirando. OK, no Brasil muita gente boa cai fora duas décadas antes dele. Mas ainda assim.
Meyer é pouco conhecido no Brasil. É o autor de Precision Journalism, um livro que encontrei empoeirado e mal lido na biblioteca da faculdade há dez anos. Nunca foi publicado no Brasil, mas diz respeito à mudança no papel do jornalismo. Já em 1973, Meyer propunha uma forma mais aprofundada de apuração, calcada nas ferramentas da informática e nas metodologias de pesquisa das ciências sociais. Ainda hoje, esse tipo de trabalho é considerado quase ficção científica no jornalismo brasileiro. Nos EUA, porém, há um prêmio anual (que leva o nome do mestre) para as reportagens de apuração mais complexa. A terceira edição deve sair nas próximas semanas.
Seu livro mais comentado saiu no Brasil: é The Vanishing Newspaper (aqui, "Os Jornais podem Desaparecer?" - o primeiro capítulo pode ser baixado aqui). Acompanhei todo o processo de produção e li o livro assim que saiu lá fora. Acho que fui o primeiro brasileiro a ler. No livro, Meyer mergulha nos dados da indústria jornalística para tentar verificar as causas do declínio da leitura de jornais e apontar possíveis soluções.
(Embora o livro seja muito comentado, quase todos os comentários se concentram apenas numa gracinha escrita pelo autor na página 16. A frase está logo abaixo de um gráfico. Ele diz: "Tente esticar aquela linha com uma régua, e ele nos mostra ficando sem leitores no primeiro trimestre de 2043". Pra mim, tinha passado batido. Mas muita gente boa tratou isso como "previsão", como se Meyer fosse um Walter Mercado ou uma Mãe Dinah. Não é o caso, nem ele apresentou o dado como tal. Isso demonstra basicamente que o pessoal não costuma ler muito além do prefácio.)
Não consegui ser orientando de Meyer na UNC, em parte por conta da minha idade. Ainda não consegui trazê-lo ao Brasil - e olha que eu tentei várias vezes, por meio da Abraji e do Centro Knight. Em 2007 ele quase veio, mas enviou um amigo no lugar. Ainda não consegui publicar aqui a tradução do "Precision Journalism". Mas neste ano acho que pelo menos meu livro sobre o assunto deve sair. Apesar disso, consegui desenvolver uma relação respeitosa e produtiva com o velho mestre via internet. Sou imensamente grato a ele por todas as idéias que me deu, direta e indiretamente. Quase ninguém sabe, mas a idéia do projeto Excelências foi conseqüência direta de uma troca de emails com ele.
A repórter do Raleigh Chronicle perguntou a ele o que vai fazer daqui pra frente. Sua resposta:
- Vou escrever. Não sei bem o quê. Talvez artigos, talvez matérias para revistas, cartas para o editor. Quem sabe?
2 comentários:
Marcelo, li algumas coisas sobre o Philip Meyer e me interessei em ler o livro dele sobre o assunto, mas achei caro. Hoje, no entanto, encontrei o texto do livro na Internet, mas fiquei na dúvida se está completo e correto.
O link é o seguinte: www.unc.edu/~pmeyer/book
Você poderia me dizer se o livro é esse mesmo?
Obrigado
A edição disponível no site é a de 1991. A que está à venda é a de 2002, bastante atualizada e melhorada. Mas, pra ter contato com as idéias do mestre, a de 1991 é suficientemente boa.
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