Recentemente, o editor-chefe da editora de quadrinhos Marvel, Joe Quesada, quis acabar com o casamento do Homem-Aranha. Poucos leitores, argumentou, se identificam com alguém casado com uma supermodelo. Para evitar o trauma do divórcio, encomendou uma série em que, num passe de mágica, Peter Parker voltasse a ser um adultescente morando na casa da tia. O roteirista resumiu assim a ordem de Quesada:
- "É mágica! Não precisa explicar!"
Tal como o Homem-Aranha, o governo andava subindo pelas paredes com os resultados do garimpo da imprensa no Portal da Transparência criado em 2005 pela CGU para dar a conhecimento público vários tipos de gastos feitos com dinheiro do contribuinte.
Pois ontem, assistindo na TV à conferência da Dilma Rousseff e dos outros ministros sobre os cartões corporativos, ouvi várias vezes o mesmo argumento dito de outra forma - trocando "mágica" por "óbvias razões de segurança".
* Seguranças da presidência almoçaram na churrascaria do irmão do presidente, em Santo André, e pagaram com o cartão de pagamento do governo? Ora, os almoços foram pagos a preços de mercado. Quais são os preços de mercado? Por óbvias razões de segurança, não se pode dizer, senão todos vão saber quantos seguranças tem o presidente.
* O ecônomo da presidência comprou vinho numa adega chique com o cartão de pagamento do governo? Por óbvias razões de segurança isso não devia ser divulgado, senão todos saberão quantos convidados recebeu o presidente e onde seu ecônomo compra vinhos.
* Seguranças compraram esteiras ergométricas com o cartão corporativo (portanto, sem licitação)? Por óbvias razões de segurança, não se pode divulgar quantas esteiras foram.
Como diria Quesada segundo Straczynsky, é mágica - não precisa explicar.
Agora o governo alterou o decreto que regulamenta o uso do cartão corporativo. Foram vedados os saques, exceto em casos de
- concessão e aplicação de suprimento de fundos, ou adiantamentos, para atender a peculiaridades dos órgãos essenciais da Presidência da República, da Vice-Presidência da República, do Ministério da Fazenda, do Ministério da Saúde, do Departamento de Polícia Federal do Ministério da Justiça, das repartições do Ministério das Relações Exteriores no exterior, bem assim de militares e de inteligência, obedecerão ao Regime Especial de Execução estabelecido em instruções aprovadas pelos respectivos Ministros de Estado, vedada a delegação de competência.
Ainda não foi decretado, mas o governo está cada vez mais firme na decisão de vedar o acesso aos dados relativos a gastos próximos ao presidente. Por óbvios motivos de segurança.
Correndo o risco de ser aleijado por um escândalo, o portal foi criado justamente pra responder a um escândalo semelhante. Vale a pena reler a notícia de quando o Portal da Transparência do governo federal foi criado, em 2005:
- O governo vai divulgar a partir deste mês os gastos com os cartões corporativos da administração federal, por meio do site Portal da Transparência. São 1.680 usuários desses cartões, que representam despesas mensais da ordem de R$ 1,19 milhão em média. A iniciativa faz parte de programa da CGU (Controladoria Geral da União) para aumentar o grau de transparência das informações da União.
Segundo a assessoria do Planalto, o programa da CGU ainda vai lançar seu próprio portal para colocar à disposição informações sobre execução orçamentária, com dados sobre licitações, contratos, convênios, passagens e diárias. Cada ministério também terá que criar seus próprios portais ao longo de 2006 para divulgar esse tipo de informação.
A CGU também vai abrir concurso público para contratar mais 300 analistas da área de Finanças e Controle, com período de inscrições em janeiro.
Em agosto, os cartões corporativos foram motivo de vários constrangimentos para o governo federal. Primeiro, houve a denúncia de que foram usadas notas frias para justificar gastos com esses cartões corporativos do Planalto, mais tarde contestada pela Casa Civil.
Supostamente, esses analistas deviam analisar as informações financeiras dos cartões pra evitar abusos.
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