Na coluna do ombudsman

Sempre digo, quando falo com estudantes, que o jornalismo costuma ser indefensável para o leitor que é especialista. E todo leitor é especialista em alguma coisa, por vivência, profissão ou diversão. Os estudantes otimistas acham que é exagero; os cínicos acham que é pouco. Costumo ilustrar o que digo com exemplos. Há poucas semanas, meu nerdismo absoluto me colocou no outro lado do balcão de um desses exemplos.

Quando o Deep Purple veio ao Brasil, no final de fevereiro, o repórter da Folha anotou que o Gillan teria dito que eles foram pela primeira vez à Rússia no dia 11 de fevereiro. Mandei ao ombudsman, Mário Magalhães, uma observação: não pode ser, pois desde 1996 eles já tocaram umas 30 vezes lá. O repórter retrucou: teria sido a primeira vez com a nova formação.

Saquei do computador uma planilha que fiz, com datas, locais e formações dos 2.021 shows do Deep Purple entre abril de 1968 e o começo deste mês. Ela mostrava que, já com Don Airey no teclado, o Deep Purple tocou 14 vezes na Rússia em 2004. A correção de um erro praticamente bobo, quase insignificante, mas que poderia ser facilmente verificado, saiu mais de duas semanas depois da matéria.

Hoje, na coluna do ombudsman, o Mário relata a história:

Jornal erra, tem 2ª chance e erra de novo

Em fevereiro, a Folha publicou declaração de um músico da banda de rock Deep Purple, falando da recente "primeira vez" na Rússia. Um leitor, jornalista, alertou: o repórter deve ter entendido errado; antes, as apresentações naquele país somaram dezenas.

A Redação retrucou: era a viagem inaugural da nova formação. O leitor, então, apresentou uma planilha, montada com disciplina e carinho, com todos os shows do grupo. Em 2004, já com novo tecladista, houve mais de dez na Rússia.

O jornal teve duas chances de acertar. Errou também na segunda. Em março, saiu "Erramos". Lição: há sempre um leitor que sabe mais do que quem escreve a notícia.