quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Fidelidade sertaneja e a dança do La Verba

Aspirações diminuídas: a rainha quer virar prefeitaJá viram a quantidade de celebridades entrando para a política recentemente? Saiu na Folha e escrevemos uma nota para o blog do Los Angeles Times a respeito. Geralmente são celebridades já fora de moda, como Gretchen e a mulher da banheira do Gugu.

A gente costuma tratar isso na brincadeira, obviamente. É mesmo folclórico. Seria no mínimo divertido ver a Gretchen como prefeita. Só não sei se seria lá muito prático. Verba, la verba...

Isso é apenas a ponta mais visível de outros debates que vêm sendo travados nos últimos tempos.

O que você pensa sobre a fidelidade partidária, por exemplo? Considera razoável a proposta de que autoridades eleitas devem perder o mandato caso saiam de seus partidos?

Há aspectos razoáveis na proposta. Antes de mais nada, porque é de fato ridículo ver o constante troca-troca partidário - seja pelos interesses eleitorais, pelos interesses do Executivo ou sabe-se lá (ou sabe-se bem) quais outros.

Ocorre fidelidade é um caminho de duas mãos, como bem sabem as duplas sertanejas. Não dá para apenas uma parte ser obrigada a ser fiel e a outra estar perfeitamente livre para conchavar com quem bem entender. Há um bom tempo não ouço falar de rigidez programática de partidos, apenas para citar um exemplo.

É fato que permitir ao eleito o uso de seu mandato como ação na bolsa de valores não é exatamente respeitar a vontade do eleitor. Mas será que colocar a "propriedade" do mandato na mão dos partidos respeita o eleitor? Eu tenho dúvidas, por três motivos.

    1) Porque a maioria dos poucos eleitores que lembram em quem votaram lembram mais do nome do candidato do que de seu partido (daí o fato de celebridades decadentes terem a brilhante idéia de partir para a política).

    2) Porque ninguém sabe exatamente o que representam os partidos hoje. O que exatamente representa o PT do B? Ou o PTC, que quis recuperar o mandato do deputado Clodovil? O extinto Prona a gente sabe que representava o Enéas, que já morreu. Os próprios partidos grandes, o que representam? Quem votou no PT antes de 2002, por exemplo, acredita que ele ainda representa o mesmo? Quem votou no PSDB antes de 1994, idem? Quem votava no PMDB nos anos 70, o que pensa?

    3) Porque muito poucos dos representantes são efetivamente eleitos apenas com o voto popular (pouco mais de 30 deputados federais, segundo o Estadão). A maior parte ganha na bruxaria matemática feita com as quantidades de votos de cada legenda.

    4) Porque mesmo a maioria dos filiados à maior parte dos partidos não consegue participar muito deles. Os partidos existem como massa de manobra matemática de seus caciques. Na Bahia, por exemplo, prefeitos com aspirações reeleitorais filiam até parentes que sequer sabem lá o que significam as siglas em que entraram. Em São Paulo, antes da eleição de 2000, trocava-se calças jeans pela assinatura de documentos de filiação, na periferia.

Já ouvi falar coisas como "mas antigamente os partidos tinham participação dos filiados". Não sei, eu não era nascido. Mas acho que é mais ou menos como dizer "no tempo em que os animais falavam". De qualquer forma, hoje isso não existe. Ou quase não existe, pra não ser injusto com algum caso que eu desconheça.

Pessoalmente, não conheço ninguém que queira entrar para a política. Mesmo quem claramente tem vocação para a lida pública. A grande reclamação: "ah, mas ter que entrar em partido..." Pois: só pode receber votos quem entra em um partido. E os partidos que temos são isso aí mesmo. Se você não sabe o que os partidos representam, como confiar neles para nos representar?

Quem entra na política, então? Alguns bem intencionados, alguns decididamente toscos, alguns procurando uma vantagem ou boquinha. Mas quem aparece mesmo é quem tem nome que "puxe voto", porque aí redistribui dentro do partido e puxa mais gente pra dentro, o que significa acesso a cargos e verbas para o partido. Conteúdo é secundário, daí as celebridades em decadência.

Como os partidos são perfeitamente desinteressantes e a vida política acaba sendo auto-referente por vários motivos, de fato desanima. Muitos dos eleitores sequer fazem idéia do que fazem com nosso dinheiro os funcionários públicos que elegemos.

Mas o pior é isto: quem rebola o "La Verba", no final, somos nós. Freak le boom boom, aiaiai!

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