quarta-feira, 30 de abril de 2008

O político no divã

Orestes Quércia, em entrevista à coluna da Monica Bergamo na Folha:

    Por que não o acordo com Marta Suplicy, do PT?
    Quércia – O ideal é que o PT não ganhe a eleição em 2010. O governo tem de mudar porque eles não têm competência para governar. E é preocupante o PT ter essa hegemonia no país. É mensalão, problemas políticos, falta de cumprimento de compromissos.

    O PT diz que o mensalão era caixa dois. O senhor também já admitiu que fez caixa dois.
    Quércia – Uma coisa era, antigamente, fazer a campanha eleitoral. Era assim. Mas pagar mensalidade para deputado? Isso é um absurdo, isso eu nunca vi. Para você ver a cabeça do PT, o perigo que isso significa, né? Agora eles aprenderam que isso daí é um absurdo. Espero que não volte a acontecer. Mas as coisas vão mal no Brasil com o PT. O governo vai bem porque o mundo inteiro vai bem. Então ele vai surfando numa onda.

Isso me lembra imensamente uma outra entrevista, feita pelo Armando Antenore com o João Gordo há uns sete anos, na mesma Folha, com o título "o punk no divã". Na época, o ex-punk estava começando a se adaptar à condição de figura pop:

    João Gordo - Hoje, mano, o movimento punk do Brasil é medíocre. Bem pior que o do meu tempo, tá ligado? Experimente rodar pelo centro de São Paulo. Você ainda verá aqueles seres horrendos, usando jaquetas de napa e cabelos espetados.

    Folha - Seres horrendos, João? Na década de 80, você se vestia de modo parecido.
    Gordo - Eu sei. Só que éramos diferentes. Íamos atrás de informação. Trocávamos discos e idéias com punks de outros países, da Alemanha, da Finlândia. Os meninos de agora não passam de uns ignorantões, que se proclamam anárquicos, libertários, mas são tão intolerantes quanto qualquer fascista, tá ligado? Há exceções, claro. A maioria, porém, adora posar de polícia ideológica. Basta alguém se destacar, lançar CD, arrumar umas turnês para eles tacharem de traidor, capitalista, playboy. Os caras de hoje são intransigentes.

    Folha - Vocês também eram.
    Gordo - É... Eu era mesmo um grande filho da puta, mano. Radicalzão. Acontece que, nos anos 70 e 80, a gente estava na época certa, entende? Por mais toscos que fôssemos, espelhávamos exatamente o que acontecia aqui e lá fora. Hoje os caras vivem um tremendo mal-entendido. Não sei qual é a dos moleques. Eles fazem protesto em Brasília, atiram pedra, mas, quando você pergunta o porquê de tanto quebra-quebra, não sabem responder. Só sabem que têm de "potrestá". "Eu quero potrestá!" [imita o sotaque nordestino" Os caras estão equivocados. Acreditam em utopia. Imaginam que irão mudar o mundo.

    Folha - Insisto, João: vocês também imaginavam.
    Gordo - Certo. Mas o tempo passa, tá ligado? E você se adapta. Esses caras de agora pensam o quê? Falam contra o capitalismo, só que é tudo ladainha. Precisam do capitalismo. Sem o capitalismo, não sobrevivem. Vão comer bosta? Aposto que os moleques ainda moram com as mães e se tornaram um peso para as velhas. Marmanjo morando na casa da velha... Eu, mano, deixei de ser trouxa. Estou na correria e não vou patinar na merda como eles. Podia continuar radical e fodido. Não vou. Quando você fica mais adulto, acaba maleando um pouco.

    Folha - Em resumo, você quer dizer que punk é coisa de jovem?
    Gordo - Praticamente, cara, praticamente.

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