sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

O Estado é ele (ou: a lógica da torcida em festa)


O governo adora a lógica de torcida.

Hoje, o ministro José Múcio Monteiro disse, ao comentar as críticas ao aumento da popularidade do presidente Lula:

    "Lamento esse recorde de popularidade por alguns que ficaram decepcionados. Porque são pessoas que torcem contra o Brasil em questões políticas."

Eu sinceramente não entendo como raios quem não gosta da popularidade do Lula "torce contra o Brasil". O Brasil é ele, por acaso? Não é mais permitido discordar das políticas dele, por acaso? E quando eles torciam contra o governo anterior, com toda a legitimidade de quem está na oposição, torciam contra o Brasil? O Estado é o Lula?

Ainda neste final de semana, fomos informados pelo ministro Franklin Martins de que "Quem torce contra a Petrobrás torce contra o Brasil". O Estado é a Petrobras?

Um adolescente que acaba de pensar em passar das páginas de esporte às de política dos jornais pode até estranhar. Coitado do Dunga: não consegue nem pôr na linha o time da Seleção, imagina controlar também a economia e a política pra não desagradar à torcida do Brasil.

Não entro em lógica de torcida nem contra e nem a favor de nada. Mais do que reconhecer a falta de lógica na lógica de torcida, ela me preocupa. Lógica de torcida não aceita nada além de alinhamento absoluto. É o "até a pé nós iremos" do Grêmio e o "louco por ti, Corinthians" - e haja bolhas no pé e vagas no hospício. A lógica da torcida exige o alinhamento até mesmo contra as evidências.

Ao exigir o alinhamento absoluto, a lógica de torcida exige necessariamente um inimigo. E leva a agressões, como se vê na porta dos estádios. Mais irracional que isso, talvez, só as manifestações mais extremistas das religiões.

Essa lógica lembra a definição de Orwell sobre o que é nacionalismo: "o hábito de supor que os seres humanos podem ser classificados como insetos e que blocos inteiros de milhões ou dezenas de milhões de pessoas podem ser consistentemente etiquetados como 'bons' ou 'ruins'."

Chega de aplicar a lógica de torcida a coisas sérias. Lugar de torcer é no estádio, não no palácio.

Até porque, como bem sabe a torcida do Corinthians do coração do presidente, torcida nenhuma evita rebaixamento.

2 comentários:

Barone disse...

Excelente análise. E o pior de tudo é que os que enxergam isso, este maniqueísmo mentiroso, são poucos. Ou será que todos vêem o mesmo e se calam? Como aceitar como normal esta condução política na qual constantemente somos chamados de idiotas? É muito para meu sábado.

Prometeu, o filho da Chama Celeste disse...

Parabéns pela análise. Vou recomendar ao pessoal do www.blogdemocrata.com.br para que eles incluam lá nesta segunda-feira.Vale a pena ler este blog. É muito bem escrito. Obrigada.